Meu corpo está cansado, mas não me permite descansar. Tenho que trocar as bandagens antes que as moscas gordas pousem em minhas chagas, e nela depositem os seus vermes. É um grande fardo carregar o peso de meu próprio corpo em moléstia - preguiçoso, doente, fraco... - e ter que poupá-lo incessantemente da decomposição.
Quando finalmente acostumo com a incômoda carga, surpreendo-me ao pisar no sangue que verte da cópia que carrego nas costas. Minha luta foi vã, e me desespero ao ver que toda a vida ficou para trás! É impossível ver o fim do rastro vermelho quilométrico, assim como repô-lo ao corpo depois que ele fugiu pelos poros da terra.
Ainda assim tento, e as mãos em concha nada mais colhem que um bolo ensanguentado de areia. Não há mais vida, mas tento colocá-la de volta pelos orifícios da vergonha. No templo reservado à concepção, agora há imundície. Não há mais vida, não há. O que conceber quando o útero vira um túmulo? Monstros de areia ou de lama? Enxugo as lágrimas com as mãos sujas. Não há o que fazer, e mesmo assim me iludo. Não há tempo para esculpir figuras! Levanto e as piso. Ponho novamente meu corpo sobre as costas, e o arrastar das pernas no chão remove qualquer vestígios das figuras na areia. Para trás fica uma trilha vazia, sem legado ou honra. Meu corpo não morreu em batalha, como a heroína que queria ser. Não foi morto pelos fantasmas ou sátiros que me assombravam. Foi morto por vícios, mas foram tantos que não lembro quais. A minha maldição é esta, de me apegar a cada chaga causada por minha própria impotência, e delas cuidar como quem rega um jardim.
Imagem: Glayohanne Lindsay

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