sexta-feira, 2 de maio de 2014

asrca irvgitinas

Tudo aquilo, porque perdi minha pureza mental no dia anterior, e agora eu podia trair. Me tornara uma meretriz. Os tempos decretavam isso. Cães sitiavam minha casa, e certamente me comeriam depois que eu morresse, ou talvez nem esperassem tanto assim.
Eu os tangia, mas não queria atirar-lhes pedras, ou vasos de minha varanda. Aquilo doeria muito, e os cacos certamente lhes perfurariam as cabeças. Eu ainda mantinha meu gosto por crânios animais.
A noite veio, e os cães foram engolidos pelas sombras. Livre daquela ameaça, fui então clinicar os pintinhos amarelos do meu quintal, que jaziam enfermos em gaiolas. Os menos doentes estavam presos, pois a peste tinha dificuldade de passar por entre as grades. Os mais debilitados, arquejavam ensopados em cima das gaiolas. Era tarde demais para eles, mas era injusto que estivessem molhados em uma noite tão fria como aquela. Quando me aproximei, vi que apenas um continuava vivo. Indignada, o cobri com uma ponta do papel toalha sujo que forrava a estrutura.
Sai à rua para ver por que o mundo andava tão louco.
Para meus gatos, a matilha não causara problemas. Estorvo era a chuva, que caía invisível de não-sei-onde. Talvez brotasse do grande abismo, mas o mundo não terminaria em fogo?! Não vejo nenhum arco-íris no céu. Mas acho que Deus não quebra suas promessas, então sentei-me a esperar pelo fogo.
E um velho amigo de rodas de violão apareceu. Acompanhava-lhe o irmão gêmeo, idêntico, porém mais alto. Este eu não conhecia, e acho que eles também se conheceram naquele mesmo dia. Porém, já andavam como irmãos, no sentindo amplo da palavra. Dei um sorriso e cumprimentei o rapaz, como se fosse meu amigo também. Eu ainda confiava no senso crítico de meu antigo companheiro.
Ele me contava sobre seu desejo de trair, e eu o condenava, pois ele era mais cristão que eu! Enquanto me falava de sua concupiscência, eu vi se formando no céu (para o qual ele dava de costas), um grande ponto luminoso, do tamanho de 10 estrelas juntas. Interrompi seu discurso sórdido e apontei para o fenômeno. Ele virou-se tardiamente, e o ponto apagou antes que pudesse vê-lo.
Tentei procurar explicações para aquilo, em voz alta. Tomei-me de incrível pavor quando vi a presença de uma segunda lua, cheia. E na escuridão, uma mancha azul da cor de "dia" riscava o céu, em movimento.
As nuvens também serpenteavam, ligeiras e cheias de maldade.
Era mesmo o fim do mundo, e meu amigo voltou a ser cristão naquele momento.
Eu entrei em casa e comecei a gritar pelo nome de Deus com o timbre rasgado do desespero.
Na casa ao lado, meu vizinho pervertido ouviu minha histeria, e vestiu suas roupas.
Eu fiquei a olhar para o céu, vendo aquelas dezenas de luas surgirem e desaparecerem. Era bizarro, pois parecia um jogo de luz de discoteca, e eu não conseguia me empenhar na salvação pensando naquela semelhança.
Mesmo em meio aquele terrível cataclisma, eu estava aliviada, pois o fardo de ser pura não estava mais sobre mim. Antes era como uma teia exposta a todos ventos do mundo.
Mais tarde eu ficaria frustrada quando visse que a pureza me estava intacta.

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